12 outubro 2006
entrevista exclusiva carga de trabalhos a benedita feijó
absolutamente disruptiva
É designer e conta já no portfólio com um trabalho que muitos gostariam de ter a oportunidade de poder realizar uma vez em toda a carreira. Ela é a portuguesa responsável pela campanha do oitavo e novo sabor ABSOLUT VODKA: RUBY RED. O carga de trabalhos foi conhecer um pouco sobre a Benedita e sobre o seu trabalho.
benedita feijó e michael andersen na interactcreative
carga de trabalhos: Quando é que decidiste que querias ser designer?
benedita feijó: Desde cedo, não sei ao certo quando, mas desde cedo.
No liceu, 11° e 12° ano, todos os coleguinhas queriam ir para arquitectura. Eu devia ser a única a querer design gráfico.
cdt: Porquê estudar fora de Portugal?
bf: Porque as escolas aqui eram muito fraquinhas. Agora, acho que são melhores. Tive a oportunidade de ir e fui. Adorei e não me arrependo nem um bocadinho.
Central Saint Martins era na altura a escola em que toda a gente queria estar. Eu consegui um lugar e foi uma excitação.
cdt: Como foi o teu percurso profissional até agora?
bf: Deu um salto grande nos últimos tempos. Antes fiz várias colaborações a nível de design e ilustração com revistas e livros internacionais e nacionais, tive projectos meus, criei uma marca de acessórios que ainda hoje é copiada (risos), tive uma galeria de fotografia (só e apenas fotografia), na altura penso que era a única no Porto, senão de Portugal, fiz exposições, de tudo um pouco. Hoje os trabalhos já são mais sérios, mais profissionais e mais bem pagos (risos).
Foi um percurso natural, penso eu.
cdt: E porque regressaste para Portugal?
bf: Ui. Teve de ser. Em Londres eu era mais uma entre milhões de criativos e há pouco espaço para tantos. Regressei com o intuito de fazer algo por Portugal, o que sinceramente, na minha opinião, pouco adianta, infelizmente. Mas fiz na mesma e não me arrependo, um dia devem reconhecer… mas se calhar tenho é de vingar primeiro “lá fora” para aqui valer alguma coisa… típico e triste, mas verdade.
cdt: Como é que surgiu o convite para o trabalho da Absolut?
bf: Fui convidada a fazê-lo. “Descobriram-me” numa revista Catalã onde já colaborei e colaboro e convidaram-me. A rojo.
projecto para a revista rojo – edição especial nike air
cdt: E a ideia para o trabalho que deu origem ao resultado final da Ruby Red…como é que apareceu?
bf: Muita noite mal dormida, muito brainstorming, muitas conversas com o Michael Andersen e é importante referir que o projecto da Absolut foi feito por mim e pelo Michael Andersen, com quem agora tenho a agência InteractCreative.
Muitas ideias, muita pesquisa, muito prazer e diversão, principalmente!
anúncio de imprensa para a Absolut Ruby Red
cdt: Onde vais buscar a tua inspiração? Há algum artista que te tenha inspirado particularmente?
bf: Vou buscá-la a muitos lugares e a muitas pessoas e procuro-a também na vida.
Tenho um artista que me inspira. Posso dizer que me inspira na forma como trabalhava e na forma como apresentava os seus trabalhos – Jean Michel Basquiat. E o que mais adoro nele foi a sua espontaneidade.
cdt: E depois de saberes que a tua proposta Absolut era a vencedora…Qual foi a sensação de seres responsável por um projecto dessa envergadura?
bf: Excitação! E o facto de ter mantido o sigilo total até tudo estar finalizado. Apenas as duas pessoas envolvidas, eu e Michael, é que sabíamos o que se passava. Foi duro manter o segredo, mas bastante positivo no final.
cdt: No projecto da Absolut, concorreram com outros profissionais… Porque achas que a escolha recaiu sobre o vosso trabalho? Alguma vez te disseram porque foram escolhidos para o projecto?
bf: Por ser algo diferente de tudo o que já tinham visto. Disseram-me que fui a escolhida por fazer um trabalho diferente e único. Disseram-me também que o meu trabalho tinha cor, muita cor e alguma alegria e diversão. Era a receita ideal para esta campanha.
spot tv Ruby Red – clique para assistir
cdt: Achas que se estivesses em Portugal, as participações na ROJO e o convite da TBWA teria surgido?
bf: Eu estou em Portugal e isso é que me fascina. Eu, desde este cantinho no mundo, posso fazer trabalhos e campanhas mundiais!
cdt: Então o convite da TBWA surgiu quando já estavas em Portugal?
bf: Sim. Já estou em Portugal há uns três anos. No momento em que me convidaram, estava a trabalhar no Museu de Serralves, na loja de design.
cdt: Como foi estar afastada de casa, da família e amigos durante os anos em que estiveste em Londres?
bf: Foi óptimo! Adorei! Apaixonei-me pela cidade e odiei-a depois. Mas foi bom. Aprendi como nunca, vi de tudo um pouco, inspirei-me bastante e comecei a encontar um caminho. Um caminho meu, percorrido por mim.
cdt: Quando regressaste a Portugal, qual era o objectivo? Procurar emprego numa empresa?
bf: Ao princípio era procurar emprego e fui a algumas entrevistas, sem sucesso. Houve uma que me disse: “Nós somos um Fiat e tu és um Ferrari!”. Achei inacreditável dizerem -me uma coisas destas sem me darem o emprego!
Penso que foi a partir desse comentário que pensei que essas empresas não eram para mim e que deveria começar a solo, a tentar por todos os lados e a espalhar trabalho onde deveria ser espalhado.
cdt: Qual era a tua perspectiva do mercado de trabalho aqui no nosso país, quando regressaste?
bf: Assustadora. Claustrofóbica. Sem ponta de risco, medrosa, má, etc… Assustei-me ao princípio. E ainda hoje me assusto.
cdt: E o novo projecto, a agência? Como surgiu?
bf: Logo a seguir à Absolut. Funcionou tão bem que só deviamos estar a trabalhar juntos. A coisa funciona bem e as ideias surgem aos dois de uma forma diferente mas complementar, o que é fascinante.
Tenho muita fé neste projecto a dois e o máximo de prazer em fazê-lo com o Michael.
cdt: Como têm corrido até agora este novo projecto? Muito trabalho? Já têm alguns clientes em carteira?
bf: Estamos em vias de conseguir um bom contracto. Segredo para já. Vamos ver. De resto, trabalhos mais pequenos mas não menos importantes.
cdt: E qual é a tua visão do mercado de trabalho hoje em dia na área do design e publicidade?
bf: Em Portugal? Fraco. Limitam-se a copiar o que já viram e funcionou. Há algumas coisas boas, mas muito honestamente pouco de novo. Um dia destes vi uma notícia de um Português que criou um robot pintor. O inventor já é considerado o máximo porque tem o robot exposto em New York. Eu ouvi o Sr. a falar e não me queria acreditar no que ouvi. Ele pura e simplesmente criou este robot porque afirma que qualquer um de nós faz arte e que não se sabe o que é arte hoje em dia??!!!
Mas esse Sr. inventor é demais para Portugal??!! Acredito que há bem melhor do que isto… tem de haver!
Em NY, por exemplo, a publicidade e o design são tudo. Sem esses dois factores as pessoas sentem-se… não sei, incompletas, talvez…
Em Portugal há mercado de trabalho, isso há, mas as coisas parecem-me um pouco sempre a mesma. E quando aparece algo de novo, surgem depois cópias falsas…
cdt: Achas que as empresas não apostam/arriscam em “sangue novo” e originalidade, preferindo sustentar-se no que viram que já deu resultados e que funcionou?
bf: Sim. Em Portugal sim. Há um medo enorme em arriscar. E não é só em design ou em ilustração. É o mesmo com fotografia, arte, arquitectura, etc…
O que me entristece bastante, porque vejo bom trabalho, vejo pessoas à minha volta que têm um talento maravilhoso e não há uma oportunidade para eles.
E sei que nos próximos anos muito pouco vai mudar. Sei também que se falarmos com criativos que vivam noutros países, nos vão dizer a mesma coisa: que as agências nao arriscam em nada, optam sempre pelo seguro. Portanto penso que é um Mundo pequeno, onde não há espaço para muitos. Na minha opinião, esse espaço tão limitado é que devia ser preenchido pelos melhores e pelos únicos e não pelos fáceis/banais, pelos que se limitam a seguir os traços e tendências já vistas e revistas em todo o lado.
Acredito em agências pequenas que respiram criatividade e não nas grandes que seguem a sua fórmula antiga sem qualquer espaço para inovação.
Tal como a InteractCreative, que de facto é pequena, mas que tem um alcance e uma versatilidade superior a muitas agências grandes. Tal deve-se ao facto de arriscarmos, sem medos ou preconceitos.
cdt: Tens algum conselho que gostarias de deixar a quem se está a iniciar nestas áreas, na procura de emprego e em termos de trabalho?
bf: Tenho. Sejam únicos no que façam. Mesmo que vos pareça mau, feio, pouco na moda, etc, etc. Sejam únicos, porque é isso que se procura hoje em dia. Autenticidade.
OBRIGADO Benedita pela enorme disponibilidade para a realização desta entrevista!